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- No universo da tecnologia, empresas frequentemente se inspiram umas nas outras, combinando ideias para criar produtos aprimorados.
- Essa prática ajuda você a ter acesso a funcionalidades funcionalmente melhores e mais adaptadas às suas necessidades.
- Essa dinâmica competitiva afeta consumidores ao influenciar a evolução de dispositivos e softwares no mercado.
- Casos emblemáticos como o desenvolvimento do Instagram Stories e disputas entre Apple, Samsung e Google ilustram essa troca contínua.
No mundo da tecnologia, é comum ver uma empresa se inspirar na outra. Ouvimos sempre que a Apple se espelhou na Samsung, que por sua vez se inspirou na Apple. O mesmo acontece com a Nintendo, PlayStation e Xbox, ou entre AMD e Nvidia. Essa troca de ideias faz parte do jogo.
O interessante é notar que essa “cópia” nem sempre é algo negativo, especialmente quando resulta em melhorias funcionais para os usuários. Vamos explorar por que essa prática é tão presente e, muitas vezes, aceita no universo tech.
A inspiração criativa no universo tecnológico
“Bons artistas copiam, grandes artistas roubam.” Essa frase, atribuída a Steve Jobs, pode parecer provocativa à primeira vista. No entanto, ela resume bem como muitos criadores, de artistas a empresas de tecnologia, operam. Não se trata de plagiar, mas de refinar ideias existentes.
O dicionário Priberam define “copiar” como imitar ou reproduzir uma obra. Já “roubar” significa subtrair às escondidas. Mas a ideia por trás da citação de Jobs é mais profunda, um conceito quase filosófico sobre criatividade e apropriação.
Nesse contexto, “copiar” seria apenas replicar algo já feito, com poucas alterações e sem originalidade real. Por outro lado, “roubar” implica em analisar diversas referências, selecionar o que há de melhor e combinar esses elementos. O resultado dessa união é frequentemente considerado único ou até mesmo genial.
Um exemplo recente é o jogo Clair Obscur: Expedition 33, lançado neste ano. Ele integra características de diferentes títulos para entregar uma experiência distinta aos jogadores. Para quem se interessa pelo tema de criatividade e inspiração, o livro “Roube Como Um Artista“, de Austin Kleon, oferece dicas.
Curiosamente, a famosa frase de Jobs não é de autoria dele. Ele mesmo atribuiu a citação a Pablo Picasso, o pintor espanhol de obras como “Guernica“. Contudo, registros históricos mostram que figuras como Igor Stravinsky, Lionel Trilling, T. S. Eliot e W.H. Davenport Adams já haviam expressado ideias muito semelhantes antes de Picasso. Isso demonstra como a inspiração é um ciclo contínuo.
Quando a imitação vira estratégia de mercado
Na indústria de tecnologia, vimos exemplos recentes dessa prática. A Apple lançou o iPhone Air alguns meses após a Samsung apresentar o Galaxy S25 Edge. De forma similar, o Google adicionou o Pixel Snap à linha Pixel 10, um recurso que até funciona com o acessório MagSafe da Apple. Recentemente, o menu de configurações rápidas na OneUI 7 da Samsung lembrou bastante a Central de Controle do iOS.
Essa abordagem não é apenas por acaso. Um dos principais motivos para essas empresas agirem de forma parecida é o “custo de troca”. Esse termo se refere à dificuldade que as pessoas sentem ao considerar mudar de marca de dispositivo. Fatores como o preço dos aparelhos de um determinado ecossistema e o tempo e esforço para se adaptar a um novo software contribuem para essa barreira.
Por exemplo, um usuário fiel da Apple, que possui um iPhone, iPad e iMac, e valoriza muito o AirDrop, veria esse recurso como essencial. Se ele pensasse em mudar de ecossistema, buscaria produtos ou serviços com uma funcionalidade semelhante. É aqui que o Google entra, lançando o Nearby Share.
Este serviço de compartilhamento conecta dispositivos Windows e Androids, buscando equilibrar a disputa. Ele serve como um atrativo para a mudança, ou pelo menos diminui a sensação de “custo de troca”. Isso porque a transição impactaria menos no uso diário do usuário.
Depois de incorporar esses elementos, a empresa busca apresentar suas próprias tecnologias exclusivas. O objetivo é convencer novos consumidores a permanecerem e fortalecer a fidelidade daqueles que já são clientes. Dessa forma, as empresas tentam reduzir o “custo de troca” para atrair novos usuários e, ao mesmo tempo, elevá-lo para quem pensa em sair. É um ciclo que se perpetua na indústria, com novas “inspirações” a cada lançamento. Os novos lançamentos da Google e Apple em sistemas operacionais para dispositivos portáteis são um bom exemplo disso.
A estratégia de Copiar na tecnologia para competir
No lado artístico, poderíamos comparar essas ações a releituras. Seriam formas distintas de apresentar a mesma solução para problemas comuns, mas com abordagens diferentes. No contexto tecnológico, porém, a dinâmica é mais de competição.
Esses exemplos se assemelham a trocas limpas, como em uma luta de boxe. Nela, não basta apenas golpear o adversário; é preciso também observar e até mesmo imitar seus movimentos para se proteger e responder à altura. É um jogo de estratégia contínuo entre os gigantes da tecnologia. Recentemente, a Apple lançou um vídeo destacando histórias reais com o Apple Watch, mostrando seu foco em funcionalidades específicas.
A Apple lançou o iPhone Air, meses depois da Samsung apresentar o Galaxy S25 Edge. O Google adicionou o Pixel Snap à linha Pixel 10, que funciona até com o acessório MagSafe da Apple. O menu de configurações rápidas na OneUI 7 da Samsung imita a Central de Controle do iOS. Esses são apenas alguns dos muitos casos.
Existem também situações onde a competição se torna menos “limpa”. Um caso notável ocorreu em 2013, quando uma rede social ganhou grande popularidade entre os jovens. O destaque era a capacidade de compartilhar fotos e vídeos que desapareciam após 24 horas, além de mensagens que sumiam permanentemente dos servidores após serem abertas.
A natureza efêmera do Snapchat criava uma sensação de momento único e compartilhado. Era algo do tipo “você tinha que estar lá para entender”, algo bem característico da juventude. Com a ascensão dos smartphones, especialmente nos EUA, era natural que essa plataforma chamasse a atenção de grandes nomes do Vale do Silício.
O Facebook, hoje Meta, tentou competir inicialmente com o Poke. Esse aplicativo tinha uma proposta similar, mas falhava no aspecto da exclusão definitiva das fotos. Isso era um ponto fraco para os usuários, que valorizavam a efemeridade do Snapchat, o que impactava negativamente o “custo de troca”.
Diante da dificuldade em competir, o Facebook buscou uma união. Em 2013, ofereceu 3 bilhões de dólares para adquirir o Snapchat, um valor que superava em 2 bilhões a avaliação de mercado da empresa na época. No entanto, o CEO Evan Spiegel, com apenas 23 anos, recusou a proposta, confiante no futuro do seu produto.
Aparentemente, Mark Zuckerberg não lidou bem com a recusa. Após um período de pequenas “adaptações”, em 2016, o Instagram implementou a função Story. Essa funcionalidade permitia postar fotos publicamente que sumiam em 24 horas, reproduzindo a principal característica que havia tornado o Snapchat tão popular. A ideia era reduzir a necessidade de manter ambos os aplicativos.
Para efetivar essa estratégia, a Meta, de acordo com documentos revelados em 2024 durante um processo entre consumidores e a empresa, usou métodos controversos. O Facebook teria lançado um projeto secreto, conhecido como “Projeto Caça-Fantasmas“. Nesse projeto, a empresa interceptou e descriptografou o tráfego de rede entre usuários e servidores do Snapchat.
O objetivo era analisar o comportamento dos usuários e ajudar o Facebook a desenvolver tecnologias para enfrentar seu rival. Isso pode ser visto como uma vantagem competitiva desleal, e até ilegal, caracterizando espionagem industrial. Apesar de tudo, o Snapchat não desapareceu e hoje possui um valor de mercado de cerca de 25.5 bilhões de dólares.
É difícil imaginar um Instagram sem os Stories. Essa função se tornou um pilar não só do Instagram, mas também do Facebook e WhatsApp. Esse tipo de “cópia” não se alinha ao que grandes nomes da arte e da tecnologia, como Steve Jobs ou Pablo Picasso, descreveriam como apropriação criativa de excelência.
Quando as ideias se perdem no caminho
Nem toda “cópia” ou adaptação resulta em sucesso. Há casos em que a estratégia falha, como a tentativa da PlayStation com o PlayStation Move para o PlayStation 3. Isso aconteceu após o enorme sucesso do Nintendo Wii e seus controles de movimento.
Lançado em 2010, quatro anos depois da estreia do Wii, o PS Move contava com uma tecnologia superior. Ele trazia conexão Bluetooth, bateria interna de lítio, um formato mais ergonômico, diversos sensores de orientação e um indicador RGB. A tecnologia era, de fato, avançada, tanto que foi utilizada posteriormente no PlayStation 4, 5 e no PSVR.
Contudo, o PS Move era caro, e poucos jogos ofereciam suporte adequado. Ele também não era tão atraente para a base de jogadores já estabelecida do PS3. Em apenas dois anos, apenas 10.5 milhões de unidades foram enviadas para revendedores, um número modesto em comparação. Embora tecnologicamente bom, o contexto de mercado e a falta de apelo para o público-alvo impediram seu êxito. Mesmo as melhores inspirações precisam ser aplicadas no momento e local certos.
No fim das contas, a frase “copia, só não faz igual” parece ser um lema na indústria tecnológica. As grandes empresas continuam a se observar, a se inspirar e a adicionar suas próprias características aos produtos. O objetivo é criar algo que se destaque, mesmo que, por vezes, isso signifique atuar em uma área de ética questionável.